segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

OPINIÃO - ANO XVIII - N° 192- DEZEMBRO 2011

Jesus – um homem entre muitos mitos
Estudos buscando resgatar a verdadeira história do homem “Jesus de Nazaré” deparam-se com mitos envolvendo deuses da Antiguidade e que foram incorporados ao cristianismo.

O dia 25 de Dezembro e as Divindades Solares
O período compreendido entre 22 e 25 de dezembro marca, no hemisfério norte, o chamado solstício de inverno, em que o sol atinge seu ponto mais baixo no horizonte, devido à inclinação do eixo terrestre. Esse fenômeno, observado já na Antiguidade, mesclou-se com a crença no Deus-Sol. Segundo explica José Pinheiro de Souza, em seu livro “Três Maneiras de Ver Jesus” (Gráfica e Editora LCR – Fortaleza/CE – jpinheirosouza@uol.com.br), “na antiguidade a principal divindade era o Sol, o Deus-Sol, uma vez que nada pode existir neste planeta sem o Sol”, que, assim, foi visto por várias culturas religiosas como “Deus”, ou “Filho de Deus”, ou como “Luz do Mundo” e “Salvador da Humanidade”.
Estudos comparativos das religiões assinalam o dia 25 de dezembro como o do nascimento de vários deuses pré-cristãos, como: Hórus (deus egípcio, 3.000 a.C.), Mitra (deus persa, adorado também em Roma, 1.200 a.C), Attis (cultuado na região de Frígia, no Império Romano) e Krishna (deus hindu, 900 a,C).

Nascimento virginal e ressurreição
Ainda segundo José Pinheiro de Souza, “o mito de partos virginais e miraculosos é antiguíssimo, encontrando-se em muitas religiões anteriores ao cristianismo”, pois “nascer de uma mãe virgem significava que a criança seria um personagem importante”. De fato, todos os deuses antes citados, Hórus, Mitra, Attis, Krishna, assim como o deus grego Dionísio, segundo as respectivas crenças, eram tidos como filhos de mães virgens. Igualmente, todos eles, ressuscitaram após a morte física, geralmente no 3º dia.
O nascimento de Jesus em Belém é hoje fortemente contestado pela maioria dos estudiosos que buscam resgatar o Jesus histórico. Tudo indica ter ele nascido em Nazaré. Para Pinheiro, “as narrativas evangélicas segundo as quais Jesus nasceu em Belém são exemplos de ‘profecia historicizada’ e não de ‘história relembrada’, para fazer-se cumprir forçosamente a profecia de Miqueias do Antigo Testamento, a qual dizia que o esperado Messias nasceria em Belém”.  





Nós e o Natal
 Se Jesus, como sustenta o espiritismo, não é Deus; se, diferentemente da dogmática cristã, ele não é o Salvador da humanidade; se não foi concebido pelo Espírito Santo - segunda pessoa da Santíssima Trindade -; se os principais símbolos miraculosos contidos nos relatos evangélicos sobre seu nascimento, morte e ressurreição, não passam de mitos importados de outras culturas religiosas, o que, sobra, então, de Jesus, esse personagem que dividiu a História entre antes e depois dele?
Sobra, exatamente, seu humanismo, tecido de elevado amor ao semelhante. Sobram as lições magnânimas de fraternidade, de entrega incondicional, de solidariedade, de alteridade, de firme consciência da igualdade essencial entre todos os seres humanos, independentemente de crença, cultura, etnia, sexo, posições políticas ou sociais.
E se as festas da cristandade, a começar pelo Natal, a mais terna de todas, estão inteiramente impregnadas dos mitos religiosos incorporados ao sincretismo cristão, que significado podem ter tais festividades para o não-crente?
Mitos, ritos, apelos ao sobrenatural e toda a magia das religiões poderão, um dia, sucumbir ante a racionalidade da História da humanidade. Mas não sucumbirão os valores que se utilizaram, provisoriamente, desses recursos para ganharem expressão concreta. Para espiritualistas sinceros que abriram mão dos símbolos, dos ritos e do sobrenaturalismo das religiões, esse valores continuam sendo primordialmente caros, porque atributos do espírito imortal. No Natal, momento maior, em nossa cultura, para se celebrar a confraternização, a amizade, as experiências vividas em mais um período de tempo que se fecha, renova-se em cada alma a disposição de servir e de amar, de agradecer e de planejar, de viver a vida na plenitude do legado deixado pelo Homem de Nazaré.
Ele não é o nosso Deus. Mas é, inquestionavelmente, nosso guia e modelo. 
(A Redação)                    







Mensagem do Presidente do CCEPA

Final de Ano
 Aproxima-se o momento da virada de ano. Momento para se fazer uma avaliação das nossas atividades durante o ano de 2011.

O Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, seguindo um propósito muito claro e firme, plasmado nas idéias inspiradoras da sua própria criação, perseverou no trabalho para a consolidação da identidade da nossa Casa, que se traduz numa visão do Espiritismo como doutrina filosófica livre-pensadora, progressista, libertadora, absolutamente otimista em relação ao ser humano. Fundamentando-se nos princípios basilares encontrados na obra e no pensamento de KARDEC, propugnamos um processo permanente de atualização do pensamento espírita, por meio de aprofundado, dialético e contínuo estudo da filosofia espírita, do debate fraterno e leal em torno de ideias. Sem dúvida, este objetivo foi plenamente realizado através do funcionamento dos nossos diversos grupos de estudos, desde os níveis básicos até os mais adiantados, onde se prima pelo exercício da liberdade de pensar e de refletir.

 O CCEPA, perfeitamente integrado ao segmento espírita laico e livre-pensador, mantem-se perfilado à Confederação Espírita Pan-Americana e à Associação Brasileira de Delegados e Amigos da CEPA. É oportuno mencionar que, no ano vindouro, realizar-se-á em Santos-SP o Congresso Espírita Pan-Americano da CEPA, evento da maior importância para a continuidade da construção deste projeto no qual nos inserimos.

Coincidindo com o final do ano, também chega a termo o período da atual Diretoria Administrativa do CCEPA. Em meu nome e em nome dos companheiros de diretoria, agradeço a colaboração de todos os trabalhadores da Casa, convidando-os a continuarmos nosso entusiasmado trabalho na Instituição para o ano de 2012.  

Rui Paulo Nazário de Oliveira
Presidente do CCEPA


                                                                                       



O maior erro judiciário da história do país
Foi assim que o Superior Tribunal de Justiça qualificou o caso do pernambucano Marcos Mariano da Silva, preso em 1976 por um crime que não cometeu. O assassinato pelo qual foi condenado havia sido praticado por um homônimo seu, foragido. Após seis anos de cadeia, apareceu o verdadeiro culpado e ele foi solto. Em 1985, voltou a ser preso numa blitz, porque seu nome constava entre os foragidos. Passou mais 13 anos na prisão, onde contraiu tuberculose e ficou cego, atingido por estilhaços de bomba de gás, numa rebelião de presos. Depois de tudo isso, entrou com uma ação contra o Estado. A decisão fixou a indenização em 2 milhões de reais. Recebeu uma parte e o Estado recorreu para não pagar o restante. No último dia 22 de novembro, nova decisão judicial determinou que lhe fosse paga a indenização integral. Marcos recebeu a notícia por telefone. Foi tirar um cochilo e não acordou mais. Morreu de infarto.
         
O conformismo religioso
Diante de injustiças como essa e dos tantos casos de impunidade, como crer na justiça? Nem estou falando nos mecanismos judiciais construídos pela sociedade, suscetíveis de erros em qualquer lugar do mundo. Refiro-me à justiça como valor filosófico, fator de equilíbrio social e individual e de estímulo ao correto agir humano.
Para compensar as injustiças do mundo, as religiões pregam o sistema de castigos e recompensas depois da morte. O cristianismo, por séculos, recomendou o conformismo e a submissão às injustiças sociais. No Brasil Colônia, Padre Antônio Vieira proclamava aos escravos que “desterro, cativeiro e desgraça” eram, para eles, o “grande milagre” que os levaria ao céu, ao contrário de seus antepassados que ardiam no fogo do inferno por não terem encontrado o “lume da fé”. As injustiças do mundo seriam, assim, o passaporte para o gozo celeste.

O caos materialista
Numa visão materialista, uma injustiça como aquela perpetrada contra Marcos é definitiva. No máximo, servirá de alerta para a criação de mecanismos sociais mais justos. Mas a reparação individual, efeito concreto da injustiça, nunca se dará, porque o indivíduo, para o materialismo, é nada.
Aprisionada entre o berço ao túmulo, a justiça abstrai-se de qualquer significação filosófica para compor o caos. Porque a vida humana também será caótica. Deixa, assim, a justiça de ser um mecanismo de educação para se fazer castigo/privilégio ou, por ironia, a suma e irreparável injustiça.

O inconformismo reencarnacionista
Entre uma e outra tese, a reencarnação proclama: toda a injustiça é reparável. Às vezes, inclusive, a aparente injustiça pode estar compondo um quadro maior visando o aprendizado e o progresso. Mas o principal efeito da reencarnação é o de gerar o inconformismo com a injustiça aqui e agora. O reencarnacionista, consciente do valor da encarnação humana, luta para que a justiça se faça aqui e agora. É um inconformado com as injustiças praticadas contra si ou o outro, porque deseja um mundo cada vez melhor.
Não por outra razão, os espíritos, questionados por Kardec, apontaram a justiça como sendo o fundamento maior da reencarnação (L.E, questão 171).
Mais uma vez, assino embaixo. 





Delegação gaúcha prestigiou
o 12º Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita
         
Uma delegação de dezesseis integrantes do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre e S.E. Casa da Prece, de Pelotas, prestigiou o 12º Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita.
Convidado para um pronunciamento, na mesa-redonda de encerramento do evento, Milton Medran Moreira, Diretor de Comunicação Social do CCEPA, lembrou episódios históricos ligados ao SBPE, de cuja primeira edição participou como expositor, a convite de Jaci Regis, juntamente com Ciro Pirondi, Krishnamurti de Carvalho Dias e outros pensadores alinhados às propostas progressistas que marcaram os anos 80.
Para homenagear Jaci, cuja ausência física foi tão sentida ao curso de todo o XII SBPE, Medran lembrou a frase de Bertold Brecht, segundo a qual, “há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida, e estes são imprescindíveis”. Acrescentou que Jaci foi imprescindível ao espiritismo brasileiro e mundial. Mas, apesar de sua imprescindibilidade, não foi insubstituível à continuidade do projeto SBPE, pois o ICKS e seus familiares souberam lhe dar andamento, nos mesmos e exitosos moldes. 

           





Fundou Jesus alguma religião?
Aureci Figueiredo Martins (Porto Alegre/RS), 
articulista e dirigente espírita; Bacharel em Direito, aposentado.

“Aceito Cristo e os Evangelhos, todavia não aceito vosso cristianismo. (Ghandi)

Quando mergulhamos na essência da mensagem de Jesus, torna-se-nos evidente a desconformidade das prédicas e práticas adotadas pelas religiões autoproclamadas “cristãs” com os lídimos ensinamentos do Excelso Mestre.
Chego até a pensar que, se Jesus voltasse hoje ao nosso ainda penumbroso plano terrenal, cristão ele não seria. Registre-se de passagem que Jesus era detestado e anatematizado pelos religiosos por não observar as exterioridades do farisaísmo da sua época.
Em parte alguma dos Evangelhos detectei Jesus vestindo paramentos, praticando rituais ou ministrando sacramentos ou quaisquer outras formas de culto exterior. Estas práticas litúrgicas foram criadas a pouco e pouco pelo cristianismo histórico, a partir da declaração, no século IV, do cristianismo como religião oficial do Império Romano pelo imperador e “pontifex maximus”, Constantino. Desde então o cristianismo passou de perseguido a perseguidor e os crimes e desmandos “ad majorem Dei gloriam” cometidos sob a capa da religião mancharam com sangue e lágrimas a história da Humanidade por muitos e muitos séculos.
Se Jesus orava a Deus, como pôde ser confundido com a Divindade? Se assim fosse, teríamos Deus orando para si mesmo? É bom lembrar que o Mestre ensinou-nos a dirigir nossas preces ao “Pai Nosso” e, quando um jovem rico o chamou “Bom Mestre!”, ele respondeu: “Por que me chamais bom?” E concluiu: “Bom só Deus o é!”.
Nas minhas observações, que confesso perfunctórias, não encontrei Jesus fazendo preces de abertura e de encerramento das suas atividades missionárias e quando orava dirigia-se ao Criador em silêncio e profundo recolhimento íntimo, usando expressões que lhe vinham ao coração e à mente naqueles momentos especiais.
Quanto aos chamados “milagres” a ele atribuídos, sabemos hoje que eventos sobrenaturais não podem acontecer, pois que todos os fenômenos que ocorrem, a qualquer tempo ou lugar, são perfeitamente afinados aos mecanismos causais das leis naturais, tão perfeitas e inalteráveis como o legislador que as estabeleceu: Deus. Tanto é assim, que Jesus declarou não ter vindo derrogar a lei, e que tudo o que ele fazia nós também poderíamos fazer...
Relativamente à chamada ressurreição de Lázaro, lê-se que, ao receber a notícia da morte do irmão de Marta e Maria, Jesus teria dito: “Lázaro não está morto; ele dorme”, evidenciando que seu amigo de Betânia estava num estado morte aparente, cataléptico. Quando o corpo morre, o espírito que o animava (alma) desliga-se da carne e, na condição de desencarnado, continua mais vivo do que antes.

Lê-se na pergunta 625 d’O Livro dos Espíritos: - Qual o tipo mais perfeito que Deus tem oferecido ao homem, para lhe servir de guia e modelo? Resposta - “Vede Jesus.” E Kardec comenta – “Para o homem, Jesus constitui o tipo da perfeição moral a que a Humanidade pode aspirar na Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo e a doutrina que ensinou é a expressão mais pura da lei do Senhor, porque, sendo ele o mais puro de quantos têm aparecido na Terra, o Espírito Divino o animava”.

Penso, concluindo, que Jesus não fundou religião alguma, pois que o Excelso Mestre, ao proclamar a libertação pelo conhecimento, estabeleceu as bases de uma filosofia vivencial espiritualizada, que impele a cada um de seus seguidores pelas trilhas luminosas do autoconhecimento, base da crença raciocinante que os induz a sempre crescente progresso intelectual e moral, sustentáculo da conduta reta e fraterna que se reflete positivamente na coletividade humana, encarnada e desencarnada.
Feliz Natal!  
                            
           





O humano e o divino
O texto de “Nossa Opinião” (CCEPA Opinião de novembro) expressa exatamente como eu penso. Aquilo que o homem atribui a uma "força externa" - no caso Deus pessoal - está imanente em si, cujo desenvolvimento é personalíssimo, no tempo de cada um. Gostei também, na “Opinião do Leitor”, do parecer de Sidney Batista, de São Paulo, especialmente no último parágrafo.
José Lázaro Boberg – Jacarezinho/PR.

A morte ante o enigma da vida (1)
Muito bom o editorial de novembro de CCEPA Opinião!
A propósito do tema, às vezes fico pensando como seria o dia em que os avanços científicos e tecnológicos farão do corpo humano uma máquina indestrutível. Parece maluquice isso, mas alguns visionários acreditam que logo esta possibilidade se tornará uma realidade. Se a morte é a maior invenção da vida, tal como disse Steve, citado na epígrafe do editorial, então o que seríamos de nós sem ela?
Vital Cruvinel, São Carlos/SP.

A morte ante o enigma da vida (2)
Um belo artigo, desta vez sobre a vida (publicado também pelo jornal “Zero Hora”, edição de 1º.11.2011). Parabéns a seu autor, editor desse jornal. Nossa cultura teme pensar e falar sobre a morte. No extremo dessa negação, alguns chegam a  rejeitar a assinatura no livro de presença dos velórios, temendo a "chamada" a partir dali.
O artigo, Milton, lembrou bem o que dizia a respeito o nosso amigo Henrique Rodrigues de que morte não é o contrário de vida, que continua...Tua crônica deve ter consolado e esclarecido muitas pessoas, que nesta época, saudosas de seus entes queridos, refletem sobre a morte. Umas resignadas ("Deus sabe o que faz!"), outras inconformadas com a justiça divina ("Por que, meu Deus?!").
Homero Ward da Rosa – Pelotas/RS.

sábado, 5 de novembro de 2011

OPINIÃO - ANO XVIII - N° 191- NOVEMBRO 2011

Haverá lugar para tanta gente no planeta Terra?

Já somos sete bilhões
de espíritos encarnados

Explosão demográfica é maior em países pobres
Pelos cálculos da ONU, no último dia 31 de outubro, nasceu, em algum lugar do mundo, o bebê que, em números redondos, fez com que a população da Terra chegasse a 7 bilhões de pessoas.
Apesar de as Nações Unidas comemorarem o fato de, nas últimas décadas, ter havido, nos países desenvolvidos e também nos emergentes, entre os quais se encontra o Brasil, uma sensível queda de expectativa de filhos por mulher, relatório recentemente elaborado sobre o tema dá conta de que a população cresce desordenadamente nas nações mais pobres do Planeta. Estima-se que a África será responsável por metade do aumento populacional dos próximos anos. Em países como a Nigéria e Somália, onde grassam a fome e a miséria, ocorrem os mais dramáticos níveis de explosão demográfica.
Nos tempos de Kardec
No ano de 1804, quando, na França, nasceu Allan Kardec, a população mundial era de 1 bilhão de pessoas. Mas, já havia a preocupação com a superpopulação planetária. Poucos anos antes (1798), o economista britânico Thomas Malthus publicara um livro onde alertava para a importância do controle de natalidade. Sustentava que a população crescia em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos aumentaria apenas em proporção aritmética. Como resultado disso, em pouco tempo, faltariam alimentos e a fome dominaria o mundo.
O tema em O Livro dos Espíritos
Como o fez com todas as questões relevantes de seu tempo, Allan Kardec submeteu o tema ao exame dos espíritos, seus interlocutores, na elaboração de O Livro dos Espíritos (1857). No capítulo em que trata da Lei de Reprodução, assim questionou as entidades espirituais: “Se a população seguir sempre a progressão crescente que vemos, chegará o momento em que ela se tornará excessiva na Terra?” (Questão 687). Os espíritos assim responderam: “Não. Deus a isso provê e mantém sempre o equilíbrio. Ele nada faz de inútil. O homem, que apenas vê um ângulo do quadro da Natureza, não pode julgar da harmonia do conjunto”.





O humano e o divino
Nada demonstra melhor a presença divina no homem do que sua capacidade de raciocinar e de agir inteligentemente. Diante de expressões tais como “Deus proverá”, “Deus operará”, etc., é de se considerar, sempre, a capacidade humana de interagir com as leis naturais, emanadas da “Inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”, Deus.
Se, há dois séculos, a mente humana foi capaz de detectar o perigo da superpopulação da Terra, hoje já dispomos de meios capazes de administrar o risco. Nesse período em que a população mundial se tornou sete vezes mais numerosa, fomos capazes de ampliar, em proporção ainda maior, nossa capacidade de produzir alimentos. A Terra, generosa, produz, hoje, o suficiente para alimentar as sete bilhões de bocas que habitam o Planeta, com possibilidades de ampliar a produtividade.
Mesmo assim, quase um bilhão de pessoas no mundo passam fome. A inteligência, presente divino feito tecnologia, foi capaz de produzir o fantástico milagre da multiplicação dos pães. Mas não se capacitou ainda a repartir convenientemente o alimento que produz. A Natureza, divina e dadivosa, fez sua parte. A ganância do ser humano, em contrapartida, não lhe permite cumprir adequadamente seu papel. Não atribuamos, pois, a uma pretensa justiça divina as condições miseráveis em que vive grande parcela da humanidade. “A desigualdade das condições sociais é obra do homem e não de Deus”, assevera a questão 806 de O Livro dos Espíritos.
De outra parte, mesmo que a alguns isso pareça uma indevida intromissão nos planos divinos, o homem foi capaz de criar mecanismos de limitação responsável da prole, atento ao princípio da dignidade de que deve se revestir a vida física do espírito. A pobreza e a deseducação, todavia, a que condenamos grande parte da população mundial impede-a de conhecer e se utilizar dos métodos anticonceptivos necessários a essa regulação.
São desafios que seguem buscando soluções humanas, num mundo onde, segundo estimativas, deverão viver mais de 10 bilhões de almas encarnadas até o fim deste século. 
(A Redação)





A morte ante o enigma da vida
A morte é provavelmente a maior invenção da vida. Steve Jobs
A morte do bem-sucedido empreendedor norte-americano Steve Jobs, mês passado, acabou por resgatar aspectos interessantíssimos de sua vida. A ampla divulgação de um discurso por ele pronunciado em 2005 a formandos da Universidade de Stanford revelou seu profundo discernimento acerca do fenômeno da vida e da morte. Contou que ao se saber portador de um câncer que o acometeu em fase relativamente jovem, resolveu pôr em prática o ensinamento de que se deve viver cada dia como se fosse o último da vida. Lembrando que ninguém quer morrer, mesmo aqueles que acham que vão para o Paraíso, seu discurso, no entanto, sugere que a morte deve ser tema de reflexão diária, além de estímulo a uma vida correta e útil.

Antes de Jobs, importante filósofo patrício seu, George Santayana, escreveu que o verdadeiro valor de uma filosofia deve ser medido pela forma como ela encara a morte. Nesse particular, a filosofia espírita assume incomensurável valoração. Como costumava dizer o insigne escritor, orador e pesquisador espírita brasileiro, Henrique Rodrigues, à luz da filosofia espírita, morte não é o contrário de vida. Se quisermos buscar um antônimo para morte, poderemos encontrá-lo no termo nascimento, pois, na verdade, tanto este como a morte são episódios igualmente inerentes à vida.    
Pensar a vida no contexto de uma filosofia dinâmica e evolucionista é, mais do que isso, contemplá-la dialeticamente como nascimento-morte-renascimento, fases integrantes da necessária e permanente renovação do espírito. Por isso foi igualmente preciso o recado deixado por Steve Jobs aos universitários de Stanford, ao definir a morte como “o agente de mudanças da vida”, na medida em que “remove o velho e abre caminho para o novo”.
Enfim, é preciso convir que nada é inútil na vida. Tudo tem seu lugar e significação, muito embora, na posição em que, eventualmente, nos encontremos, nem sempre possamos avaliar a importância de um evento. Não é diferente com a morte. O ser humano só poderá aquilatar sua significação quando estiver em condições de decifrar o ainda, para a maioria, enigmático fenômeno da vida. 

  



Crença e moral
Se buscarmos um elemento comum a praticamente todas as religiões, além da crença em Deus, com certeza iremos nos deparar com o conceito de alma ou espírito. Em todos os tempos, todos os povos guardaram a convicção de que há, no homem, um componente imortal, sede de sua consciência individual.
Mas – curioso! – a crença, como tal, não resolveu o problema moral da humanidade. Ao contrário, a fé religiosa parece desviar o ser humano de seu entorno natural, levando-o à busca frenética do mistério. Para cultuar o sobrenatural, as religiões engendradas pelo homem, terminam por desprezar a límpida moral emergente das leis da natureza. Criando seus dogmas, códigos, hierarquias, sacerdócios, ritos e liturgias, fazem desses aparatos pontes para o sobrenatural, o que lhes assegura poder e domínio.

Não basta ter fé
As chamadas “teocracias”, ou “governos de Deus” se constituíram nas mais cruéis e sanguinárias ditaduras. Ainda o são, em pleno Século XXI, em culturas que insistem em não fazer concessão ao laicismo e à liberdade de pensamento. Subsistem resquícios teocráticos mesmo nas democracias, onde se elegem governantes e parlamentares comprometidos com crenças retrógradas, capazes, na prática, de anular os valores historicamente conquistados pelo homem.
Então, para o cultivo da ética, não basta ter fé. Tampouco, basta ter uma religião. Fé religiosa e ética frequentemente se contrapõem.

O sentido da vida
É preciso acrescentar à fé uma ampla compreensão do sentido maior da vida. E viver de acordo com esse sentido, que, em sua essência, é o da prática do bem, do amor, da justiça, da caridade para com todos.
Ideais como de liberdade, igualdade, fraternidade, que não foram postulações religiosas, mas, via de regra, conquistas obtidas contra a religião, indicam a aspiração do homem no sentido do progresso.
É nesse movimento espontâneo que se pode identificar a força do espírito imortal, fagulha da própria divindade, que a todos alcança, crentes ou não, mas, indistintamente, filhos de um mesmo Deus e vocacionados à perfeição. O enfoque da vida a partir da realidade do espírito conduz ao mais autêntico humanismo.

O humanismo espírita
Uma postura otimista acerca do homem deve ser marca fundamental do espírita. Crer em Deus e não acreditar no homem é contrassenso. É admitir a falibilidade divina: o Criador teria projetado muito mal a criatura. Teria se enganado com relação a ela.
Aquele que acredita no homem crê também no progresso da humanidade como um todo, ou de uma nação como grupo de indivíduos.
Basta ver o que fomos e o que somos para avaliarmos o que seremos.
O mal-estar que vivemos, fruto de desmandos e desequilíbrios, não indica retrocesso. Hoje, as injustiças e a corrupção nos fazem mais mal do que ontem. Aparecem mais, porque nos revoltamos mais contra elas, tomados de louca obsessão por debelá-las.
Se já somos capazes de assim sentir é porque podemos operar transformações: “A aspiração por uma ordem superior de coisas é indício da possibilidade de atingi-la”, escreveu Kardec, em solene declaração de fé na humanidade. Assino embaixo.







Casa da Prece – 35 anos
comemorados com ciclo de palestras

A passagem dos 35 anos da S.E.Casa da Prece, de Pelotas/RS, está sendo comemorada com um ciclo de palestras a cargo de expositores convidados.
Dia 1º de outubro, o físico e escritor porto-alegrense, Moacir Costa de Araújo Lima falou sobre “Reencarnação à luz da Física Quântica”. Em 15/10, Milton Medran Moreira foi o expositor do tema “Espiritismo em Tempos de Inquietação”. Na oportunidade, o presidente da Casa, Homero Ward da Rosa fez interessante síntese histórica da instituição e, especialmente, do papel desempenhado por uma de suas fundadoras, Maria da Glória Rosa Martins (desencarnada em 2008), em cuja residência se reunia o grupo de senhoras que deu origem à Casa da Prece.
A programação de aniversário prossegue neste 5/11, com a palestra “Sexualidade, Família e Reencarnação”, seguida do mini-seminário “Sintomas Clínicos da Mediunidade” (6/11), ambas atividades a cargo do médico Ricardo Di Bernardi (Florianópolis/SC).


Clarividência é tema de Le Journal Spirite
Enviado por seu Diretor, Jacques Peccatte, recebemos a edição digitalizada de Le Journal Spirite, publicado em Nancy, França, pelo Cercle Spirite Allan Kardec. A edição de outubro/2011, em espanhol, com tradução de Ruth Newmann (Venezuela) trata do tema “clarividencia”, com fartas referências teórico-doutrinárias sobre o assunto e relatos de experiências naquele núcleo espírita francês.
A edição digital em espanhol pode ser solicitada gratuitamente pelo e-mail: j.peccatte@free.fr


Tempos de Inquietação: tema de Dezembro no CCEPA
A palestra pública de dezembro, na última segunda-feira (5/12 às 20h30), no Centro Cultural Espírita de Porto Alegre estará a cargo do Diretor de Comunicação Social da instituição, Milton Medran Moreira, versando sobre “Espiritismo em Tempos de Inquietação”.
Dia 7 de novembro, a conferência mensal pública foi com Ascêncio Balaguez: “Conexão com Espíritos”.





Da humana existência
Paulo Cesar Fernandes, Filósofo – Santos-SP

Sim, humana. É dos seres humanos e para seres humanos a destinação do presente artigo. Não está focado nos viventes em realidade não corpórea, mas nos espíritos que existencialmente e fisicamente habitam o nosso Planeta Terra. Este é o foco.
Por que usar no título a ordem inversa numa construção da Renascença? Para enfatizar o humano, tendo o existencial como qualificador do dia-a-dia do homem, inexoravelmente. É uma realidade da qual este não se pode desvincular. Viver é um ato existencial.
A morte, esse fantasma que assombra a humanidade desde tempos imemoriais. Não temos memória ou lembrança do momento em que pela primeira vez ela nos assombrou. Esta nos surpreende desde os primeiros tempos da passagem terrestre: um avô, uma tia, uma avó bonachona, deixam a vida em momento inesperado. Mesmo um animal de estimação pode morrer, trazendo ao ingressante do planeta alguma sensação de vazio e desconforto.
Diante da presença da morte, descobre a criança ou adolescente a sua condição de ente biológico; e o faz de forma mais profunda e impactante do que poderiam lhe trazer quaisquer aulas de ciências biológicas dos bancos escolares. É tocada sua emoção, seu sentimento.
Muito além do biológico que o homem é, da consciência de si mesmo compartilhada com os animais, é possuidor de algumas coisas a mais: a razão; a imaginação; e ampla gama de sentimentos e emoções. Faz parte da natureza, portanto está sujeito à Lei Divina ou Natural (LDN), mas se sente incapaz de modificar qualquer dos aspectos dessa Lei, por ser ela universal e perene. Daí lhe advém a sensação de impotência diante de seus ditames.
Tendo a razão como instrumental, é capaz de desvendar aspectos da LDN, mas cada aspecto desvendado lhe abre novas portas, trazendo novos desafios. Essa é a dinâmica do conhecimento. Segundo Fromm[1] “o homem é o único animal para quem sua existência é um problema que ele tem que solucionar e do qual não pode fugir. Ele não pode voltar ao estado pré-humano de harmonia com a Natureza; tem de prosseguir para desenvolver sua razão até que se torne senhor da Natureza e de si mesmo”.
A única possibilidade de fuga seria o suicídio, se este trouxesse realmente o fim. Diante da imortalidade e da reencarnação essa opção cai por terra: o Espírito segue existindo.
Na atualidade, muitos homens e mulheres urbanos têm profunda nostalgia com relação à harmonia do meio rural. Se sentem apartados da natureza, descontentes. E tal descontentamento acaba sendo uma das alavancas do progresso. Impele-os na busca de novas opções. Querendo tornar para si conhecido aquilo que desconhecem, procuram respostas. Sentem necessidade de prestar contas de si a si mesmo. Saber o significado de sua existência terrestre e das atribulações desta.
Sabedor de sua condição de ser biológico e tendo a morte como um fato, a duração da vida terrena lhe impede o desenvolvimento das potencialidades plenas, melhor dizendo: de todas elas. Percebe suas possibilidades e é incapaz de transformar potência em ato.
Como poderia o homem desenvolver todas as suas potencialidades? Fazer de todas as suas potências atos? Tendo o tempo da Humanidade. Mas, isso parece impossível se deixarmos nossos pés na Terra, mirando uma só existência. Se olharmos, porém, a imortalidade da alma como uma aliada, essa angústia existencial de ampliação de potencialidades se desfará no ar. O tempo sai da condição de algoz para se tornar um aliado.
Mesmo a morte, “angústia de quem vive” segundo Vinicius, passa a ter relativa significação, embora busquemos viver plenamente sempre, a cada minuto. Spinoza diz que “tudo o que o homem tiver dará pela vida, e o homem sábio não pensa na morte, e sim na vida”.
Somos solitários em nossa jornada espiritual. Na busca de decisões importantes na nossa vida atual. E quanto mais solitários nos sabemos, maior importância atribuímos ao outro. O outro que partilha conosco: seja no lar, no campo profissional, ou em qualquer outra área. Este é sempre o espelho onde podemos nos mirar, o referencial para nos sentirmos vivos e também gente. Isolamento denota patologia.
É no confronto e no encontro com seus semelhantes que o homem dá significado à própria vida. Um significado baseado nalguma certeza, porém também nas incertezas capazes de alavancar a expansão de suas forças, suas potencialidades, trazendo produtividade ao seu existir no mundo, valendo-se da razão e da sensibilidade humana da qual é portador, sendo o uso de tais características a fonte de reencontro consigo mesmo. O humano, se ligando ao outro humano numa perspectiva de solidariedade.
Segundo Fromm: “Todos os homens são ‘idealistas’ e anseiam por algo além da mera satisfação física. Eles divergem na espécie de idéias em que acreditam. As melhores, assim como as mais satânicas expressões da mente do homem, não são manifestações de sua carne, e sim desse ‘idealismo’ de seu espírito”.
Em que pese o texto de Fromm não se valer de terminologia espírita, mais adequada a meu ver, seu alerta é importante, pois coloca responsabilidade e autonomia diante de nós, tal qual faz o Espiritismo: fomos criados simples e ignorantes, chegamos ao patamar do pensamento contínuo, para enveredar cada vez mais no crescimento do senso de justiça e ampliar os conceitos da moral dominante na sociedade em que vivemos.
          E basta!
[1] FROMM, Erich “Análise do Homem”. Rio de janeiro : Zahar Editores, 19xx.






Parabéns por recordarem os 150 anos do Auto-de-Fé de Barcelona (CCEPA Opinião/outubro-2011). As perseguições hoje são apenas mais sutis. Mas se expressam através da exclusão dos espíritas no debate das grandes questões de nosso tempo.
          Giane de Ávila Cruzado – Campinas/SP       
         
          A entrevista concedida pelo editor desse jornal ao site Pense - http://www.viasantos.com:80/pense/arquivo/1347 - não só é esclarecedora, mas também deliciosa, palatável. Identifico-me com esse desejo, anelo de aspiração ao entendimento do Espiritismo desatrelado das concepções religiosas, como uma Filosofia científico existencial-socialista da realidade do Espírito. Sim, companheiros, a proposta espírita tem por escopo a autolibertação da consciência do Homem, Espírito imortal, escoimando-se dos ranços e resíduos das crenças religiosas alimentadas no caudal das nossas vivencias ancestrais.
Parabéns ao nobre Milton Medran, pela inteligência dos conceitos emitidos, pela justeza, a meu ver, com os postulados e o pensamento de Kardec, que embora formulados no contexto de época do século XIX, devem ser refletidos e atualizados no foro íntimo de cada criatura, no transcorrer do tempo inesgotável. Por isso, Kardec proclama que "Fé (não no sentido religioso de buscar soluções exógenas de salvação, mas na conscientização do autoconhecimento de cada indivíduo) inabalável só é a que encara a Razão face a face, em todas as épocas da Humanidade". 
          Sidnei Batista - São Paulo/SP

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

OPINIÃO - ANO XVIII - N° 190- OUTUBRO 2011

Auto-de-Fé de Barcelona – 150 anos
A 9 de outubro de 1861, na Esplanada de Barcelona, Espanha, foram queimados, por ordem do bispo local, 300 livros espíritas, legalmente importados da França. O episódio ocorrido há 150 anos passou à História como o Auto-de-Fé de Barcelona.
       
           Um verdadeiro ato inquisitorial
          Segundo uma testemunha, que enviou relato à Revista Espírita, editada por Allan Kardec, naquele dia, “às dez horas e meia da manhã, sobre a esplanada da cidade de Barcelona, no lugar onde são executados os criminosos condenados ao último suplício, e por ordem do bispo desta cidade, foram queimados trezentos volumes e brochuras sobre o Espiritismo”, devidamente arrolados pelo informante, que também registrou a presença das seguintes pessoas: “Um padre revestido das roupas sacerdotais, trazendo a cruz numa mão e a tocha na outra mão; um notário encarregado de redigir a ata do auto-de-fé; o escrevente do notário; um empregado superior da administração da alfândega; três moços (serventes) da alfândega, encarregados de manter o fogo; um agente da alfândega representando o proprietário das obras condenadas pelo bispo. Acrescentou a testemunha: “Uma multidão inumerável encobria os passeios e cobria a imensa esplanada onde se elevava a fogueira”. O relato concluiu assim: “Quando o fogo consumiu os trezentos volumes ou brochuras espíritas, o padre e seus ajudantes se retiraram, cobertos pelas vaias e as maldições dos numerosos assistentes que gritavam: Abaixo a Inquisição! Numerosas pessoas, em seguida, se aproximaram da fogueira e recolheram suas cinzas”.

            O “resto da Idade Média”
          O registro feito por Allan Kardec, na edição de novembro de 1861 da Revista Espírita, estranha que, em pleno Século 19, ainda se censurassem livros na Espanha, e que essa tarefa fosse entregue às autoridades eclesiásticas. Chamou isso de “o resto da Idade Média”. Citou a comunicação de um espírito que assim se expressou: “Hoje a retaguarda da inquisição fez seu último auto-de-fé”. Mesmo assim, previa que o acontecimento seria proveitoso ao espiritismo, pois “a perseguição sempre foi aproveitável à ideia que se quis proscrever”, já que “por aí se lhe exalta a importância, se lhe desperta a atenção, fazendo-o conhecer por aqueles que o ignoram”. De fato, décadas depois, o espiritismo teria na Espanha um extraordinário incremento, sendo um dos países onde mais se cultivaram suas ideias, até eclosão de novos eventos tirânicos, como a 1ª e 2ª Guerras Mundiais e, especialmente, a ditadura salazarista do Século 20, quando, novamente em colaboração com a Igreja Católica, o espiritismo foi reprimido e sua prática punida pelo Estado.
          Expressando sua fé na expansão das ideias espíritas, apesar das perseguições que começavam, Allan Kardec, em seu artigo, deixou esta lapidar sentença: “Podem se queimar os livros, mas não se queimam ideias; as chamas das fogueiras as superexcitam em lugar de abafá-las”, pois “quando uma ideia é grande e generosa, ela encontra milhares de peitos prontos para aspirá-la”. 



           




            A lógica episcopal
          A decisão do bispo Manuel Joaquín Tarancón y Morón, ordenando a queima dos livros espíritas apreendidos na alfândega de Barcelona fundava-se em uma lógica tão falsa quão falso é o silogismo em que se apoiou. “A Igreja Católica é universal, e sendo os livros contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles venham a perverter a moral e a religião de outros países”, sentenciou o prelado do alto de sua autoridade, supostamente divina e, logo, superior a qualquer razão humana.
          Estranha lógica essa que, no entanto, não se pense esteja inteiramente derrogada. Já não se queimam livros em praça pública, resultado das conquistas que a sociedade civil, a duras penas, arrancou da teocracia, em sua épica luta a favor da liberdade. Mas sempre que o dogma tenta se sobrepor à razão, e a fé pretensamente revelada pelo “Alto” busca derrogar a lei natural, gravada na consciência do espírito humano, se estará fazendo ressurgir a velha e falsa lógica responsável pelos maiores crimes contra a liberdade de pensamento.   
          A crença na posse da verdade revelada e em sua infalibilidade e imutabilidade inspiraram, ao curso da História, o desprezo à construção do pensamento e, pior, ao próprio ser humano que ousasse pensar. Dogma e humanismo são inconciliáveis. Mas, humanismo e espiritualismo podem se complementar.  Este confere àquele uma dimensão ampliada, sublimando-o.
          O espiritismo, mesmo que vulgarmente confundido com um novo sistema de fé ou como uma nova revelação religiosa, é, essencialmente, uma forma revolucionária de ver o próprio ser humano. É o humanismo na sua expressão evolutiva, progressiva e transcendente.
 Sem liberdade de pensar e investigar não se faz espiritismo. Os livros que o bispo de Barcelona mandou queimar apontavam para essa “perigosa” proposta, incompatível com a “verdade eterna e imutável" da qual o prelado se julgava guardião.  Na sua lógica e naquela que ainda impera em certos meios religiosos, inclusive espíritas, é dever de uns dizer o que os outros podem ou não podem ler. E para que certas publicações não cheguem a seus fiéis, tudo é válido: escondam-se-as, proíbam-se a circulação nos seus “templos” e, mesmo, a simples menção de seus autores. São formas simbólicas e dissimuladas de se queimar livros, jornais, revistas... e pessoas! Tudo em nome de uma lógica que cheira a sacristia, um “resto de Idade Média”, como disse Kardec. (A Redação).





Expulsar ou Educar?
Os piores demônios desse mundo estão dentro de seu coração e é ali que você trava as grandes batalhas de sua vida.   Sergio Siqueira
É grande a afluência aos rituais de “expulsão dos demônios”. Partindo do pressuposto de que todos os males pessoais - da doença aos infortúnios no amor, e do desemprego aos insucessos econômicos - derivam de uma avassaladora e irresistível influência demoníaca, pastores, apóstolos, bispos e missionários, nos templos, na TV e no rádio, valem-se de barulhentos rituais para, supostamente, libertar seus fiéis – ou candidatos a fiéis – da influência dos “encostos” ou espíritos malévolos que só existem para fazer o mal.
          Diferentemente da interpretação espírita, os demônios das religiões cristãs são seres perpetuamente voltados ao mal. A influência por eles exercida sobre pessoas e grupos tem por exclusiva finalidade trazer-lhes sofrimento, e, por conseguinte, fortalecer o reinado do mal. Ensina a teologia que estão os demônios em constante luta contra o bem, comandado este pelo “Senhor Jesus”.
A partir dessa visão maniqueísta, arrogam-se as religiões o poder de dar combate aos “espíritos malévolos”, numa disputa, palmo a palmo, cujo êxito ou fracasso se medirá pelo número de almas salvas ou condenadas, numa conta a ser definitivamente fechada no dia do Juízo Final.
          Tais crenças já trouxeram muito mal à humanidade. Infundiram a ideia de que estamos sempre submetidos a forças exteriores, misteriosas e poderosas, e que, sem o auxílio das religiões e a incondicional submissão às suas regras e rituais, forçosamente seremos dominados pelas potências do mal. Por si próprio, o ser humano nada é e nada pode. Para se liberar da influência dos espíritos maus, capazes de infernizar sua vida, aqui e no além, terão, necessariamente, de recorrer à autoridade religiosa que, com poderes especiais para expulsá-los, devolverá àquele que crê – e só a este - o bem estar, a saúde, o amor e a riqueza.
          Fosse essa a realidade, onde não existissem exorcismos, rituais de expulsão de espíritos malignos, jamais reinaria a prosperidade, a concórdia, o bem, a justiça, a ordem e a paz interior e social. Sociedades laicas, inevitavelmente, seriam manobradas pelas forças do mal, a partir do além.
          O espiritismo aceita a realidade da influência espiritual para o bem ou para o mal. Admite, inclusive, que se possa interferir diretamente, graças ao fenômeno da comunicabilidade dos espíritos e da relação destes com os encarnados, na educação e no esclarecimento de entidades espirituais temporariamente dominadas pela vontade de prejudicar seres encarnados. Mas, nesse mister, o que o espiritismo  busca, acima de tudo, é mostrar a encarnados e desencarnados que seu processo de crescimento e de sanidade moral e física depende precipuamente de sua ação, de seu comportamento afinado com bem e o progresso, individual e coletivo.
          No imaginário popular, sabe-se, persiste a ideia de que o espiritismo é, essencialmente, uma prática capaz de afastar os “maus espíritos”, embora por processos reconhecidamente diferenciados daqueles das igrejas. Mesmo assim, e para que a doutrina espírita não seja confundida ou igualada à concepção que aquelas guardam acerca dos “espíritos maus”, é preciso investir cada vez mais na ideia de que espiritismo é educação. Educação para a vida e para a liberdade.
Necessário é deixar claro que o que chamamos de desobsessão difere dos rituais cristãos de “expulsão dos demônios” não apenas no método e na forma. Sua diferença principal radica na visão libertadora que o espiritismo tem acerca da natureza, origem e destino dos espíritos. Evolução e progresso são leis que atingem todos os espíritos, estejam eles estagiando no mundo material ou fora dele. Nessa perspectiva, não há o mal eterno e se uma luta é travada entre o bem e o mal, esta tem por campo a intimidade da consciência. Isso é educação fundada em uma filosofia libertadora.
         






Istambul, agosto/2011
No último dia 29 de agosto, estávamos, Sílvia e eu, em Istambul, encerrando um roteiro turístico de três semanas, que começara ali mesmo e se estendera por outras regiões da Turquia e Grécia. Desde que lá chegáramos, sabíamos que os muçulmanos viviam o mês do Ramadã, período em que os seguidores de Maomé fazem jejum diariamente. Algo como a Semana Santa dos cristãos, pelo menos de antigamente (nunca vou me esquecer da contrição que tomava conta de minha mãe, naquele tempo, quando, rigorosamente, deixava de comer carne na Quaresma e jejuava em todas as sextas-feiras do período). Existe isso ainda entre os católicos? Se há, com certeza, não é igual ao Ramadã muçulmano, mesmo na Turquia, o país mais laico dentre eles.

O fim do Ramadã
Naquela noite, o povo estava todo na rua. As casas que vendem iguarias feitas de amêndoas, pistaches, mel e outras delícias da região regurgitavam de gente. O jejum estava terminando. Nos dias seguintes, as famílias se visitariam para saborear os tradicionais doces turcos. Durante os dias em que ali estivéramos, nos chamou atenção a enorme frequência de populares às mesquitas. Ficavam horas fazendo orações. Em volta daqueles monumentais templos, gente deitada nos bancos, com ar sofrido. Tinham de passar o dia todo sem comer, sem fumar, sem fazer sexo, sem beber, inclusive água. Só à noite quebrariam levemente o jejum para recomeçá-lo no outro dia. Assim, tinha sido por todo o mês de agosto. Agora, finda a penitência, era tempo de comer, de beber, de gozar tudo aquilo a que renunciaram por quatro semanas.

          As religiões e o sacrifício
          Todas as grandes tradições religiosas impõem períodos de abstinências e penitências a seus fiéis para lhes ensinar a dominar as paixões. Não há religião sem sacrifício, escreveu Mahatma Gandhi. Elas partem da premissa de que os gozos da vida são o caminho do pecado, que, por sua vez, leva à condenação. Afastando-nos do prazer, elas querem nos salvar.
Será assim mesmo? Talvez elas tenham uma parcela de razão, na medida em que o ser humano não haja encontrado ainda o caminho da moderação, do equilíbrio.

Os inventores do pecado
De repente, a Praça Taxsim, onde estávamos, é invadida por viaturas de onde descem dezenas, centenas de policiais fortemente armados que se espalham pelo centro da cidade: “Algum atentado?”, pergunto. “Não”, me responde um popular: “As pessoas hoje bebem muito para compensar o tempo em que não podiam fazê-lo, e, por isso, precisam ser vigiadas”.
Pergunto a mim mesmo: terá valido a pena sacrificarem-se por tantos dias para, depois, se entregarem aos excessos?
          Pecado é deixar de gozar as coisas boas da vida, com a moderação e o equilíbrio que ela exige de nós, todos os dias. Possivelmente, no dia em que o ser humano tiver assimilado isso, não necessite mais de religiões, e estas terão assimilado a admoestação de Chico Buarque de Holanda: “Você que inventou o pecado, ora faça o favor de desinventar”.






 A ética e os interesses pessoais
 Mário Molfino, advogado e escritor argentino. Diretor     
da Sociedad  Espiritismo Verdadero – Rafaela /AR.

          Um grande dilema que se encontra em constante interação é o problema da ética e sua relação com o interesse pessoal.
          Em muitas ocasiões, as atitudes e as formas de manifestação individual e social parecem obedecer mais aos interesses do que à ética, tomando-se esta expressão como sinônimo de moral. Pensa-se que a ética é somente uma moldura, um padrão que nos é imposto de fora para dentro e não um referencial da consciência.
          Necessário é, inicialmente, reconhecer o outro, perceber-lhes as necessidades, as limitações e, muitas vezes, as carências, não apenas materiais, mas também emocionais, para que sejamos capazes de transcender nosso próprio horizonte e dar testemunho de solidariedade e trabalho responsável.
          Desde Aristóteles, se repete, exaustivamente, que a virtude é a disposição adquirida para fazer o bem. Virtude é, pois, o esforço para comportar-se bem.
          As chamadas virtudes morais fazem com que um homem pareça mais humano ou melhor que o outro e constituem nossos valores morais encarnados e vividos em interação contínua com o semelhante, como expressava Montaigne
          A maturidade de uma pessoa é assinalada pela capacidade de apreciar a natureza da dor e das necessidades alheias.
          É indubitável que toda a ação começa a partir de um ser que pensa, em primeiro lugar em si mesmo, e que, obviamente, não se porá contra si próprio. Entretanto, a transformação da forma de ver e de se conduzir tem suas raízes no reconhecimento do próximo, superando os interesses pessoais e, às vezes, egoístas.    
          Immanuel Kant sustentava que embora não exista prêmio para as boas ações, a recompensa do agir moral é ele próprio, é o sujeito se saber possuidor de uma ética do comportamento. E é justamente aqui que se faz necessário analisar o conceito de Bem comum, como ponto de partida do indivíduo em direção a seus semelhantes.
          O significado do “comum” tem sua origem no ponto em que dois paralelos deixam de sê-lo e se tocam.
          O Bem comum é o bem estar dos indivíduos enquanto membros de uma comunidade social o política, ou seja, o conjunto dos valores que os indivíduos necessitam e que, entretanto, só podem buscar e, efetivamente obter, em forma conjunta, numa relação social regida pela concórdia. Ali, interesses e ações deixam de ser individuais para se converterem em plurais, solidários e participativos levando à concretização da ideia de Justiça.
          O bem não é para ser contemplado, mas ali está por se fazer, por ser plasmado em atos humanos. Já o esforço para comportar-se no sentido do bem se define na conquista da Virtude.
          Observa-se, assim, que existe uma dinâmica que começa com ação e o interesse pessoal, nutre-se do conceito de bem comum, ou seja, a conduta não afeta o semelhante, nem vulnera aspectos que fazem a vida em comunidade. Finalmente, a reiteração de ações nesse sentido culmina na Virtude.
          Céticos sustentam que por de trás de toda ação moral há um interesse pessoal. Indubitavelmente, em muitos casos é assim mesmo. Mas, igualmente, na natureza humana são abundantes ações que fogem dessas circunstâncias e não são por elas explicáveis.
              Há no ser humano matizes de consciência social, de respeito ao próximo e à vida em sociedade. Eles asseguram que interesses pessoais podem conviver com o Bem comum, alimentando o círculo virtuoso da generosidade, do altruísmo e da bondade. Tudo convergindo para um clima de convivência mais harmônica e um desenvolvimento político e social mais justo e equitativo.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                  
 

           
           S.E. Casa da Prece, Pelotas, 35 anos
          A Sociedade Espírita Casa da Prece, completou 35 anos de fundação, em 09 de abril deste ano. Em comemoração ao seu aniversário, a instituição pelotense filiada à CEPA está promovendo reflexões sobre a influência do espiritismo no mundo contemporâneo. Uma série de palestras se sucederá até março de 2012. 
          Convidado pelo presidente da Casa da Prece, Homero Ward da Rosa, o editor deste jornal, Milton Medran Moreira, lá estará proferindo palestra, no próximo dia 15 de outubro, às 18h, com o tema “Espiritismo em Tempos de Inquietação”.

            CCEPA organiza caravana ao XII Simpósio
       Brasileiro do Pensamento  Espírita
           Cerca de 15 integrantes do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA – estão se mobilizando com vistas à participação no XII SBPE – Santos/SP, de 11 a 14 de outubro. O grupo está sendo coordenado pelo vice-presidente do CCEPA, Salomão Jacob Benchaya, que também participará do evento.
          Companheiros do interior da Capital ou interior do Estado que queiram se juntar à caravana, podem entrar em contato com o CCEPA, através do e-mail ccepars@gmail.com . Deseja-se conciliar horários de voos para possibilitar a contratação de transporte até Santos. O ICKS, organizador do Simpósio, tem convênio com o Hotel Praiano para hospedar os participantes do SBPE, com valores de 385 reais o apartamento duplo e 360 para triplo, incluindo inscrição e café da manhã, para os três dias do evento. Maiores informações pelo e-mail  ickardecista@terra.com.br .

  
Conexão com Espíritos – o tema de novembro

          Aureci Figueiredo Martins foi o palestrante da primeira segunda-feira de outubro, dia 3, no Centro Cultural Espírita, com o tema: “Fundou Jesus Alguma Religião?”
          Prosseguindo no programa de conferências públicas mensais, no próximo dia 7 de novembro, às 20h30, ocupará a tribuna do CCEPA o Professor Ascêncio Balaguez, com o tema “Conexão com Espíritos”. A entrada é franca.

        


          


         
          
         Lucidez e seriedade do CCEPA Opinião
Parabéns aos editores de CCEPA Opinião, pelos artigos lúcidos, sérios, de conteúdo inteligente, sempre compatíveis com os ensinamentos da Doutrina dos ESPÍRITOS, codificada por Allan Kardec que, na época, era um espírito encarnado, portanto um espírito também..
Paz e Esperança.
Manuel F. J. de Macedo – Bragança Paulista/SP

O mundo dos espíritos
Sobre “Nossa Opinião” do mês de agosto, "O indefinível mundo dos espíritos", permita-me discordar, pois as informações contidas nas obras de Paramahansa Yogananda e outros iogues contemporâneos, e nas psicografias de André Luiz, Patrícia e tantos outros espíritos-espíritas já são suficientes para se definir bastante o mundo dos espíritos.
Obrigado e uma abraço,

Antonio Baracat - Inconfidentes, MG.

Entrevista do editor de CCEPA Opinião
 Felicito-os pela excelente entrevista com Milton Medran Moreira, “O Espiritismo e as Questões de Nosso Tempo” - http://www.viasantos.com:80/pense/arquivo/1347.html . O conteúdo rico e consciencioso de suas respostas foi realmente um regalo para meu espírito, sequioso de compreender o espiritismo na sociedade de hoje, globalizada e multicultural. Em França, dirijo, há 18 anos, a Associacion Parisienne d’Etudes Spirites (APES), com ativa participação no movimento espírita francês. O posicionamento de Medran, relativo às questões de nosso tempo, não é em nada diferente do que tentamos sustentar no estudo e práticas espíritas na França. Autorizados pelo editor, desejamos traduzir a entrevista para o francês, divulgando-a em nosso site: http://www.apes.asso.fr/ .

Anita Becquerel – Presidente de APES – Paris, França.